terça-feira, 27 de agosto de 2024

Cão-robot de madeira, ou não?

This is not true, but it is very easy to do.

imagem criada com Inteligência Artificial, em Craiyon

A criatividade, caraterística apreciada no ser humano, tanto por ser rara, como por estar frequentemente na origem de coisas belas, novas, anteriormente inexistentes, está a viver um momento bastante surpreendente. 

Os GPT (Generative Pre-trained Transformer), que criam imagem, texto, imagem a partir de texto e muito mais, vieram trazer uma nova dimensão à "invenção".


segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Auto-retrato de Van Gogh, mais ou menos

 This is not true, but it is very easy to do.


imagem criada com Inteligência Artificial, em Craiyon

Se eu escrevesse que foi encontrada uma nova obra de Vincent van Gogh, um auto-retrato absolutamente extraordinário, que representava uma evolução desconhecida na sua maneira de pintar, já que alongava os traços e lhes dada a aparência de circuitos de computador e apresentasse esta imagem do quadro, acreditaria? Ou colocaria a possibilidade de não ser verdade, de ser um exagero, de não ter percebido bem, ou outras?

E se eu escrevesse que a obra foi avaliada em 80 milhões de dólares e que pertence a um colecionador que quer manter-se incógnito, mas está vendedor. Ficaria tentado a partilhar, pelo sim, pelo não? Os fãs de van Gogh haveriam de ficar encantados.

E, se em vez de ser eu a escrever, fosse uma entidade que se apresentava como uma empresa, com um ar super sofisticado, um site impecável e um bot do mais simpático que há. Podia parecer possível?

E se fosse publicado nas redes sociais, se tornasse viral e, depois, fosse noticiado nos grandes canais internacionais e nacionais. Acreditava? 

E, indepentemente da resposta ser sim, ou não, com que fundamento? 

Admitindo que não é altamente especializado em arte e, mais concretamente, em Vincent van Gogh, que é uma pessoa normal que gosta muito deste pintor, teria um grande desejo de que aparecessem coisas novas dele, certo? O que talvez desse uma predisposição a acreditar em novas obras que aparecem, situação rara, mas não inédita. 

Também poderia saber que pintou quadros bastante diferentes, então porque não poderia ter pintado mais um diferente? 

E quanto tempo e estudo dedicaria à questão, para formar uma opinião com fundamento sólido? Horas, dias, semanas, meses? 

Todas estas questões são pertinentes e, à medida que a Inteligência Artificial Generativa se desenvolve e é gratuitamente acessível a todos os que tenham um computador ou smartphone com acesso à internet, tornam-se mais pertinentes ainda.

Distinguir a verdade da mentira pode, até de um ponto de vista filosófico, da neurociência, da linguística, do direito, de outras áreas do saber, ser considerada uma impossibilidade, de acordo com os critérios que estiverem em causa. No entanto, para uma pessoa comum, a verdade corresponde à realidade e a mentira é uma falsidade.

Acontece que estamos a começar a ficar para além desse ponto. 

A imagem apresentada neste post foi feita por mim, dando instruções (prompts) a uma ferramenta de Inteligência Artificial, denominada Craiyon, acima identificada e com o respetivo link inserido, disponibilizada gratuitamente na internet.

Qualquer pessoa a poderia ter feito. 

Eventualmente, até o próprio Vincent van Gogh, no seu tempo e pelo seu pincel.

Qualquer pessoa pode pintar, desenhar, fotografar o que quiser, limitando-se a dar instruções de texto a dizer o que pretende.

Fica demonstrado que realidade e invenção, verdade e mentira, estão mais difíceis de distinguir e que atualmente, com a ferramenta de inteligência artificial apropriada a imaginação humana se expande de um modo incrível e impensado até à pouco, fora do campo da ficção científica.

  

 



 

segunda-feira, 24 de julho de 2023

Filósofos pré-socráticos - paradoxo designativo

Os filósofos pré-socráticos não são anteriores a Sócrates.

É bom sabê-lo. Em primeiro lugar, porque os paradoxos são sempre apetitosos.

Depois, na medida em que é um minúsculo passo no sentido de se ter algum conhecimento.

É, também, bom sabê-lo na medida em que aumenta a consciência da dimensão da ignorância que se tem o que, não só é saudável e revigorante, como faz jus ao próprio Sócrates que levou uma vida inteira para saber que nada sabia. O que, como se não bastasse, lhe valeu um copo com cicuta que não lhe fez nada bem à saúde.

Esse conjunto de pessoas, algumas contemporâneas de Sócrates, ganhou essa denominação por uns estudiosos do século XIX terem chegado à conclusão de que havia “uma diferença significativa de interesses” entre umas e outro. Ao conjunto das primeiras, os estudiosos chamaram, como Aristóteles, “físicos”, porque se dedicavam a questões sobre a natureza e origens do mundo. Já Sócrates preocupava-se principalmente com a ética.

São fascinantes, os pré-socráticos. Aparentemente disseram tudo o que havia para dizer, mas resumidamente.

É por isso que vou ver se os abordo, um a um, como um exercício de memória, que bem merecem. E, depois, vou por aí fora, por todos os tempos e por todo o mundo.

Com todo o mérito de “Uma História da Filosofia”, de A. C. Grayling, com que conto para conseguir contar.


quarta-feira, 7 de setembro de 2022

Mezli, o restaurante-robot – de Stanford à street food

 


Em San Francisco, está em funcionamento o, mais ou menos, primeiro restaurante completamente automatizado do mundo. Tem a forma de um contentor que, de um lado, recebe os pedidos dos clientes que se atrevem a experimentar e, do outro lado, lhes entrega a refeição que escolheram. Pelo meio, mistura ingredientes, leva-os ao forno, faz misturas programadas.

Foi criado por três empreendedores oriundos de Stanford que trataram da robotização. Juntou-se-lhes um chef de cozinha, já que uma coisa é apresentar comida, outra é ser suficientemente saborosa para se desejar consumi-la.

Fica mais barata e foi considerada “pretty good” por um crítico de cozinha. É o que a SingularityHub e a Eater San Francisco nos contam, com detalhe.


domingo, 25 de abril de 2021

Klara e o Sol

 

Candura dura como o metal de que é feita pode ser a primeira, segunda e, principalmente a última impressão que nos deixa o mais recente livro de Kazuo Ishiguro. A candura de Ishiguro tem muito em comum com a de Steinbeck. São estilos de escrita totalmente diferentes, mas o fio condutor, a glia que une as personagens, as histórias pequenas que deixam ver a grande, maior que o livro, maior que a vida, a brutalidade incomensurável ternamente descrita, sem floreados, sem adjetivos, só factos pontiagudos, aguçados, dilacerantes, docemente colocados um a seguir ao outro, como se só pudesse ser assim, vislumbrando-se alternativas possíveis e inviáveis, como numa enxurrada que vai por onde iria sempre, mesmo que pudesse ir por outo lado.  

Não é uma candura subjetiva, humana, pequena, individual. Praticável. É a candura subjacente à humanidade, ao Universo, intemporal, amoral, avassaladora.

Não vou contar o livro, refiro só o que está na contracapa, que é público e notório. Klara é a protagonista narradora, uma Amiga Artificial (AA), que espera numa loja para ser comprada, de modo a conseguir concretizar o objetivo da sua criação.

Kazuo é japonês e inglês, em simultâneo. Nasceu no japão, é de substrato japonês. Foi para Inglaterra aos cinco anos, cresceu inglês. Nasceu numa ilha a Oriente, fez-se noutra ilha, a Ocidente. A escrita de Ishiguro tem a depuração, a essência, o sentido de dever japoneses, num cenário ocidental. Deixa quase tudo à imaginação do leitor, o que poderá ser a caraterística mais estrutural dos grandes clássicos. Cada um, em cada tempo e lugar, preenche a história com a sua história, com o seu conhecimento, com a sua experiência, fazendo de cada leitura um exemplar único do livro, que se perpetua infinitamente. Este vencedor do prémio Nobel da Literatura, em 2017, faz isso magistralmente. Tece uma teia aberta, dá a estrutura e o cenário, traça os contornos das personagens e deixa-nos o encargo de construir a narrativa que será a nossa, com a nossa substancia, terrores e anseios.

A história é do futuro, mas pouco.

Vale a pena, para todos, mas principalmente para quem segue o tema da Inteligência Artificial, aproveitar esta oportunidade para absorver o que a arte, em geral, e a literatura, em particular, fazem melhor que qualquer ciência: a criação de hipóteses que nos permitem visualizar, intuir, saber o que foi, é e será.

“O sol tem sempre forma de nos alcançar”. 


quarta-feira, 31 de março de 2021

BPM e a frequência da terra

 

“BPM” são batidas por minuto, unidade de medida no coração e na música. É também o título do novo álbum que Salvador Sobral está a lançar. Ontem, numa entrevista, o autor explicava que quando fez um transplante de coração e estava no hospital, tinha sempre o batimento cardíaco monitorizado, identificado no ecrã por BPM. Como batidas por minuto é também a medida da música, no tempo que ali passou, esse elo dava-lhe sentido e alento.

Parece que a terra também tem o seu “batimento” que, na frequência 7.83 Hz, poderá coincidir com ondas do cérebro humano, influenciando-o.

A possibilidade de existir um ritmo comum, subjacente a tudo, é uma questão, no mínimo, emocionante.

sábado, 27 de março de 2021

O miolo da noz


Os bons livros de ficção contêm em si sínteses extraordinárias, difíceis de encontrar noutros recipientes, com a exceção, normalmente menos bela, dos provérbios populares. 

Deparei-me agora com uma pequena pilha de livros que foram saindo das prateleiras por alguma razão e foram ficando empilhados numa desarrumada arrumação durante muito tempo. Peguei neles e ia distribuí-los pelas respetivas secções a que pertencem, seguindo o critério relativamente vago e muito flexível das minhas estantes.

A questão é que quando isso acontece, isto é, quando pego em livros que li há muito tempo, com a intenção de os transportar de um sítio para outro, dificilmente resisto à tentação de os abrir ao acaso, passando os olhos por alguns parágrafos. O que se lhe segue é ser invadida pelo espanto, encher-me de um “como é que é possível pensar/escrever/sintetizar tão bem?”, enquanto me encosto ou sento onde estiver, esquecida do que ia fazer.

Acabou de acontecer, com a agravante de que havia uma página com um canto dobrado, que me propus reconduzir ao estado direito, enquanto pensava se seria um esquecimento de marcação dum tempo em que os marcadores oficiais eram raros, ou se estaria a assinalar algo notável.

Fiquei imediatamente esclarecida ao encontrar o seguinte: 

"Não posso resumir em meia dúzia de frases o que levou séculos a acontecer. No entanto, como o miolo de uma noz e a semente de um fruto, exprimem o esforço de toda a árvore, a essência da vida, talvez consiga… Pensa nisto: mandei as minhas três filhas para muito longe do nosso país porque previ a concatenação de acontecimentos que redundariam em catástrofe para o nosso povo. Desejava que vocês sobrevivessem.
- Que acontecimentos?
Madame Liang pôs o cigarro no cinzeiro, para poder contar pelos dedos. Começou pelo pequenino da mão esquerda e foi até ao polegar:”.

Em Pearl S. Buck, As Três Filhas da Senhora Liang, Colecção Dois Mundos, Edição «Livros do Brasil» Lisboa, Rua dos Caetanos 22,1969, p.63. Diz também “Venda interdita nos Estados Unidos do Brasil”.