A vontade de emitir opiniões
tem-me vindo a diminuir. Atualmente tende para o zero.
O momento próprio para dar
opiniões é a adolescência, altura em que somos suficientemente ignorantes para
as ter em abundância e sem grandes reticências e sabemos exatamente para onde
mudar o mundo, o que é um descanso.
Um pouco mais tarde, em jovens,
já começamos a ter algumas dúvidas, mas a pujança intelectual e física, o
impulso imparável da energia que acumulamos, leva-nos a desconsiderá-las e a
avançar para concretizar ideias novas e de grande fôlego.
Novas, na medida em
que é possível ter ideias novas, que é quase nenhuma. Desde as sociedades mais
antigas, passando por Roma e pela Grécia Clássica,
sábios de proveniências várias, religiosos e leigos, afirmam com propriedade
que já tudo foi dito e feito sobre tudo. O que significa que, normalmente, uma
ideia nova é nova para quem a tem, por desconhecimento de que já havia sido
tida. O que não tira mérito nenhum, antes pelo contrário, já que ter ideias
excelentes por si próprio, idênticas às que alguém brilhante já teve algures no
tempo, é maravilhoso.
Mais tarde, é costume enveredarmos
por uma profissão ou área e especializarmo-nos. Não tem de ser necessariamente especialização intelectual ou científica, pode ser na agricultura, na indústria, nos serviços.
Pode, também, ser na própria opinião, seja em humanidades, com recurso a muita cultura
geral e estudo específico de alguma matéria, seja em ciências naturais,
engenharia ou outras. Pode, numa derivação, ser no jornalismo, que recolhe e
trabalha factos e opiniões. Nessa especialização, ficamos reféns do
afunilamento a que nos sujeitamos que nos aporta algum saber e a consequente
prudência ao enunciá-lo, pela consciência de que qualquer afirmação contém em
si a necessidade de colocar balizas, reservas e exceções.
Quanto ao resto
mantemo-nos essencialmente ignorantes, numa espécie de adolescência perpétua,
que nos permite ter opiniões descontraídas sobre quase tudo. A maioria de nós
sem qualquer consciência disso, com a enorme vantagem da satisfação de se dizer
o que se pensa, como se isso fosse em si coisa boa. Pode ser bom quando a
opinião é escrita e quem a escreve pensa bem e sabe usar a pena, ou quando é verbal
e quem a diz pensa bem e sabe usar a palavra. Em ambos os casos tudo assenta
muito na qualidade da retórica. Quando a opinião é de um político é só isso, a
opinião de um político. Pode ser aquela ou qualquer outra e terá os defeitos e
as qualidades inerentes à forma como é expressa.
A propensão para a opinião,
principalmente convicta e com certeza, existe na razão inversa da consciência
da nossa desmesurada ignorância. “Só sei que nada sei”, como terá dito
Sócrates, após uma vida de sabedoria, pela qual escolheu morrer.
Estudar alguma
coisa abre horizontes e faz-nos ver, enquanto aprendemos, o que não estamos a
aprender. É como um túnel em forma de cone, que se alarga à medida que
caminhamos numa linha que, na melhor das hipóteses, poderá engrossar
ligeiramente.
Não me parece que seja por, eventual e inevitavelmente, poder ter adquirido algum saber que a vontade de opinar se me está a congelar. Tenho de sobra a quantidade de
ignorância necessária para poder escrever ou dizer várias coisas sobre várias
coisas que basicamente desconheço.
Temo que seja por intuir que há presentemente opinião em excesso e, nesse caso, podemos ao menos poupar o universo à minha. Com resultado semelhante a deixar de usar palhinhas de plástico para evitar que apareçam no nariz duma tartaruga nas redes sociais, enquanto observo a ilha de plástico no Pacífico Norte que tem uma dimensão superior à superfície conjunta da França, Espanha e Alemanha ou as crianças a correr sobre as águas de rios pobres tão cobertos de lixo que lhes permitem a proeza.